sexta-feira, 25 de abril de 2008

De uns tempos pra cá

Passei a querer ser
De uns tempos pra cá
O que tento parecer
Preciso me procurar

Ao riscar o fósforo
Ao correr o risco
Ao rasgar as fotos
Em que estou ridículo

Apenas para quem teme
Perder o que pensa que tem
Sobre a terra que treme
Inumando o desumano trem.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Sob domesticação selvagem

Não posso regressar
Quando fui tanto pra frente
Se eu ando pra trás
O tempo fica logo impaciente

Agora eu não recuo
É tarde para quem pensa
Na saudade cara de um minuto
A idade declara sem clemência

Mesmo arfando, não retrocedo
Depois que abiscoitei coragem
Abafando medo
Sob domesticação selvagem

Na onda do oceano
Que estronda até no retorno
Ao passar dos anos
Às estrelas através do lodo.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Cheio de horizontes

Antes que me desmonte
Distante da alma
Laxante do ar
Enxergo uma ponte
Chego a arquitetá-la
Por apreço ao lugar
Nado neste monte
De fardo, de água
Chamado de mar
Cheio de horizontes
Com cheiro de nada
Feito por não tentar.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Calores e incêndios

Se os meus desejos são
Irmãos dos do seu coração
Bebamos do refresco do tempo
Entre calores e incêndios

Naveguemos no que nos circunda
E não nos afunda nunca
A despeito das tempestades
E dos egos em combate

Nossa química passa por cima
Dos belicosos climas
De frases bombásticas
E ávidas pela última palavra

Nada como um armistício ao telefone
No desígnio de adormecer a noite insone
Se os meus sonhos se assemelham
Aos que lhe despertam a cabeça.

sábado, 12 de abril de 2008

A cada dia pintado a óleo

Eu me contento
Não é que eu me engane
Com as coisas incorpóreas que tenho
Da história e no espírito a sangue

Eu me satisfaço
Não é que eu abdique
As idéias absurdas que faço
Com garra, na guerra e no piquenique

Longe de ser pernóstico
Tiro o meu chapéu
E o velho véu daqueles óculos
Para reconhecer o céu

A cada dia pintado a óleo
Graças a um alheio pincel
Mas íntimo aos olhos
Desde que o mundo nasceu.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

Do que te fere em mim

Eu fico mais abjeto
Do que anjo no inferno
Quando te molesto

Eu estou dividido
Entre o sigilo tímido
E o grato grito

Eu me sinto tão só
Quanto o que te dói
Espólio de brechó

Eu sou a tua família
E tu és a minha
Conexão transvitalícia.

terça-feira, 8 de abril de 2008

A misteriosa bússola

Os dias andam tão depressa
Que amanhã o ano acaba
Sem nenhum afã para a festa
A fim de que o calendário não saiba

Confesso que estou confuso
Não sei se alguém me explora
Ou se eu próprio me uso
No mofo que produzo agora

Desta parede de intrigas
Podem cair raros quadros
Porém somos almas amigas
Em corpos conjugados

É mister me guiar pelo coração
A seguir a misteriosa bússola
Porque as portas se abrirão
Para prosseguir com a busca

domingo, 6 de abril de 2008

Numa hora dessas

Quando acaba a adolescência tardia
Os meus trajes a rancor
No ocaso coberto de razão e de dia
Extraem o que não combinou

Sei que não posso me afugentar
Da minha própria caveira às pressas
Mas eu me aventuro a agendar
Um encontro comigo numa hora dessas

Só pra cruzar o rio de jacarés
Da fortaleza munida de armas
À procura da fleuma de muitos mil-réis
No mercado dos carmas.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Maiores pormenores

Um farelo de juízo
Uma pitada de finura
Entre o apego e o aviso
Arredo o afeto da fúria

Uma miséria de cautela
Uma bagatela de calma
Enquanto o tempo atropela
Quando não pára

Uma migalha de espelho
Uma nesga de olhar
Para dentro de si mesmo
Guarda a casa singular.