sábado, 29 de março de 2008

Vigas e alvenaria

Enquanto as pessoas passeiam
Cantando numa boa no inferno
Eu tento ser mais do que uma idéia

Cada dia que atravesso é livro
E dica para os versos que ponho
Entre vigas e alvenaria do abrigo

Ao passo que as pessoas dançam
No atraso que pensa em ser eterno
Eu experimento a nossa esperança

No olho do furacão medonho
Fora o medo da fusão, há indícios
Demais para ser só um sonho.

terça-feira, 25 de março de 2008

Como sempre se quis

Chega de saudade
Que chegue salutar
E saliente a felicidade
A fim de nos saudar

Como sempre se quis
Embora não pareça
Por causas e casos hostis

Basta de jogos
Basta nos jogarmos
À vida tão logo
O maremoto vire lago

E ainda a página e a mesa
Para um arremate feliz
O acaso nos arremessa.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Por volta das nove da noite de amanhã ou Qualquer data de validade

Ludibrio a fome que não some
Com quase um litro de som

Espero alguém que me ame
Por volta das nove da noite de amanhã

Escultura de unhas caninas
Deportação de cravos

E das conterrâneas espinhas
Do rosto menos pesado

Tirando os fios brancos
Do couro cabeludo

Da capa do crânio
Do cérebro em estudo

Penso que venço o tempo
Mas é só a mim mesmo

Qualquer data de validade
Mata cedo ou tarde.

domingo, 23 de março de 2008

Graça e agressão

Não quero mais obter
A felicidade ingrata
Agora me apetecem
Novas formas de saber
E de saborear a inata
Soberba da espécie

Não gosto mais de agradecer
Pela felicidade irresistível
E falsificada nos intervalos
Em graça e agressão ao ser
Hipnotizado no hospício
De rédeas, alfafas, éguas e cavalos

Não preciso mais perder
A felicidade interior
E ardente desde sempre
Para outra vez me compadecer
Ao perceber o sabor
Acerbo entre os dentes.

sábado, 22 de março de 2008

Apesar da gravidade

Nas cores leves do dia
Alegre de aleluia
Pior nunca do que tardia
A plenitude da lua

E das estrelas de outros futuros
Apesar da gravidade
Do fácil entendimento

Ao pisar os pés de chumbo
É como se sobrevoasse
O baque após este momento

Além do sábado
E do estado do continente
De pés de barro
E de utopias pertinentes.

quarta-feira, 19 de março de 2008

Depois do dilúculo

O estômago queima
De chocolate no vácuo
E a noite em ondas teima
Em chacoalhar o barco

Depois do dilúculo
Durante o calor fraco
Dentadas nos músculos
Salivam por sustentáculos

Os livros de astrologia
Proporcionam algo
Que eu já compreendia
Num sentido mágico

Coca-cola zero
A essa hora sugere obstáculos
Na caça por sossego
Mas não embaça como álcool.

sábado, 15 de março de 2008

Cigarra

Não sou mais supérfluo
Com briosa paz, eu supero
Os encantos do efêmero
E os quebrantos de Érebo

Os tempos estão estranhos
E sinto uma calma higiênica
Mas ainda me banho
Com uma fina urgência

Não posso ser tão melífluo
Senão adoço demais e me melo
Com a burocracia das formigas
Sou cigarra antes das cinzas.

terça-feira, 11 de março de 2008

Um amor tão

Um amor tão belo
Abole com beijos
O clima bélico
Pra não ficar cabreiro

Um amor tão robusto
Quanto brusco
Faz jus a estátuas e bustos
Em locais públicos

E não é em virtude
Da inversão dos pólos
Nem do degelo das calotas

Mas para estar amiúde
No cinema dos olhos
Ou, ao menos, à porta.

terça-feira, 4 de março de 2008

Secreto decreto

É mais do que uma mera frase:
Uma nova era nasce
Alheia à cova de praxe
E anexa às covas da face
Deixa de ser entrave
Queixa-se do quase
E derrota a imobilidade
Da porta sem a chave.

É muito menos capricho
Do que um secreto decreto
Reciclo o tempo e o lixo
Já fedendo de velho
E no melhor sentido
Eu me altero
Para me aturar fixo
Na altura do que for descoberto.