quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Da realidade do absurdo

Ouvindo como a chuva
A música que me fez
A vontade única
A última vez

Eu paro e admito
Que os tempos mudaram
Os lábios do infinito
Quase beijando a cara.

Mas não é motivo de susto
Para quem não tem medo
Da realidade do absurdo

Eu vivo e recomendo
Um pouco mais de mundo
De loucos acontecimentos.

domingo, 27 de janeiro de 2008

A tiracolo

Gasto muito dinheiro
Mas não levarei nada
No dia derradeiro
Da minha jornada

Confesso que bolo
Com as loucuras
Que tenho a tiracolo
No outro lado da lua.

Escrevo

Escrevo de modo compulsivo
Para moldar a solidão
Senão eu não sobrevivo
Nem se tivesse um milhão

De reais privilégios
Se eu não escrevesse
Seria um sacrilégio
Um maior estresse

Escrevo para não parecer
Parado, enfadonho
Não saboto o que serei
Concordo com os meus sonhos.

Entregue à sorte

À janela de um lugar
Que nem estudei
Vejo sem olhar
Descubro o que sei

Papel higiênico
Como suporte
Do meu pensamento
Entregue à sorte

Embora sozinho
Não me sinto triste
Longe do ninho
Do dedo em riste

Eu quero na verdade
É passar mal
De tanta felicidade
Afinal, é carnaval.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Crônica morte anunciada

Conto até dez
Respiro fundo
Mais uma vez
Penso no mundo
Morrendo por leis
Acatados estupros
Eu e todos vocês
Estamos juntos

No mesmo barco
São muitas bocas
Para poucos pratos
Caem as bolsas
Fichas e trocados
Para comprar coisas
Sem nenhum legado
Nem sob fiança ou à força.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

A mídia e a bíblia

O mundo se dilui num escarcéu
Maior do que os presságios
Entre a terra e o céu
Não tem essa de pedágio

Creio menos na mídia
Do que nas entrelinhas
Não leio a bíblia
Sou mais as ladainhas

Assisto aos telejornais
Como se estivesse num enterro
As imagens são tão brutais
Quanto as sessões de descarrego

A humanidade já morreu
Não veio sequer o padre
O que diria o diabo ou Deus
Ao ver sua obra de arte?

Só às vezes

A chuva por ora cessa
A cabeça não fica
Suja nem possessa
Está aberta a bica

Lavo as minhas mãos
E levo as suas
Instrumentos irmãos
Que secam e suam

Água sem mágoa em gás
Verte palavras leves
Como o ar
Bebo a sede

Necessidade tão remota
Quanto as fezes
Que não se mostram
Sempre, só às vezes.

sábado, 19 de janeiro de 2008

Como um alento

Eu não escrevo
Só por passatempo
A moça da mesa perto
De mim redige correndo

Com ou sem cerveja, versejo
Como um alento
À solidão pétrea
De outras eras.

Eu também gosto de ler
Quando estou só
E nas vezes que quero ser
Jogador de futebol

Talvez não me faça entender
Tampouco o sol
Que teima em esconder
O verdadeiro farol.

Eu não me deixo

Estou com os pés
Apontados à porta
Caso não tenha vez
Para as chaves tortas

Estou com a voz quase
Nula de tanto gritar
A inata frase
Que se mata no ar

Eu uso a caneta
No lugar do cigarro
E a minha veneta
Contra qualquer pitaco

Na boa mesmo
Estou bem assim
Eu não me deixo
Nem por mim.

Alternativa

Através de palavras
Não consigo dizer
O que quero que saiba

Não é mesmo pra perceber
Nem que seja na marra
Ou de modo cortês

Cada um vive
Como bem entende
Na loucura, feliz e livre

A vida se faz na lente
E a alternativa num clique
Revela-se pertinente.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Pombos, pipocas e carnaval

Pombos não voam quando
Há pipocas, ainda que poucas,
No chão esquentando
Na cidade carioca

Mal começa o ano
E não ouço outra prosa
Em todos os cantos
Em todas as rodas

É carnaval enquanto
A vida dá escolhas
E eu nem opto tanto
Depois tudo se acorda.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Tenho que arrancar

Tenho que arrancar de casa
Os sacos plásticos cheios
De cinzas, de cacos, de mágoa
E os e-mails da caixa de correio

Tenho que arrancar de mim
As fezes, os medos, os suicídios
A poeira, o gesso, o motim
E esta pessoa da tabela de indivíduos.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Não mais

Não mais peço
Apenas agradeço
A cada manhã
Que acordo

Não mais desço
Já sei o preço
Amargo da maçã
Que mordo

Não mais meço
O que perco
E as posses vãs
Que engodo

Não mais esqueço
O meu endereço
De nunca pra amanhã
Eu transbordo.

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

Sou uma pessoa

Tirei o dedo da tomada
Rasguei o medo e a camisa
Sou uma pessoa aguerrida
E a decisão está tomada

Larguei a bola de ferro
Recebi alta do hospital
Sou uma pessoa capital
Se não for, eu me ferro.